João 8 e 9
Nosso estudo de hoje vai tratar de dois acontecimentos na vida de Jesus e que apontam o poder de Jesus não só para perdoar pecados, mas também para a cura de uma doença. Estudos atuais falam de doenças provenientes de situações emocionais não resolvidas e sabemos que a culpa é a causa de muitos males físicos. Apesar dos episódios de hoje poderem ser relacionados a partir disso, eles não se passaram com a mesma pessoa. De um lado temos uma mulher apanhada em adultério e, de outro, um cego de nascença. Ambos, após o toque de Jesus, tiveram suas vidas modificadas e foram reconhecidas como pessoas que experimentaram o poder de Deus nas suas vidas.
Comecemos pelos primeiros onze versículos do capítulo 8 de João. É episódio que existiu, durante anos, à parte do cânon, mas que nunca teve seu valor de Escritura questionado. Há quem discuta que o estilo é de Lucas, mas a localização em João atende perfeitamente ao contexto dos capítulos 6 a 8. Aconteceu no Templo de Jerusalém, ainda durante a Festa das Tendas, objeto do nosso último estudo. Jesus pernoitava no Monte das Oliveiras, local onde pouco tempo depois entregaria a sua vida por nós e voltava para o Templo ao amanhecer, onde enfrentava a rejeição do poder religioso da época.
Em função da Festa das Tendas ou Festa da Luz, acendiam-se, junto do Templo, grandes candelabros, daí a importância da declaração que se seguirá: “EU SOU a luz do mundo”. Jesus ensinava, quando a aula foi interrompida por escribas e fariseus, que traziam uma mulher que havia sido apanhada em adultério. Estavam alicerçados na Lei, que, em Dt. 22,22-24 e Lv. 20,10 discorria sobre as providências a serem adotadas com tais pessoas. O casal deveria ser apedrejado mas, por alguma razão, apenas a mulher foi levada naquela oportunidade. Os religiosos trazem a mulher até Jesus e o fazem com sentença pronta.
Claro está que desejavam colocar Jesus em dificuldade: os romanos não permitiam que os judeus executassem a pena de morte, consoante lemos em 18,31. Se Jesus mandasse apedrejá-la, enfrentaria conflito com os romanos. Se o conselho fosse para que não a apedrejassem, seria acusado de estar contra a lei de Moisés.
Jesus apenas inclinou-se e começou a escrever no chão com o dedo. É interessante notar que o verbo escrever pode significar também “redigir uma acusação”. Não sabemos o que ele escreveu, mas bem pode ser que aqueles acusadores e também o povo que leu o Evangelho tivessem em mente as palavras de Jeremias 17, 13, onde lemos: “Senhor, Esperança de Israel! Todos aqueles que te deixam serão envergonhados; os que se apartam de mim serão escritos sobre a terra; porque abandonam o Senhor, a fonte das águas vivas.”
Os acusadores insistem. Têm pressa. Jesus, então, sem levantar os olhos, responde: “quem do vocês não tiver pecado, atire nela a primeira pedra.” (8,7). Um a um os homens se retiram, por ordem de idade. A mulher permanece lá, no meio, onde havia sido colocada poucos minutos antes. Jesus se levanta. Maravilhoso Jesus, este. Contempla a mulher e oferece a ela uma oportunidade de vida: “nem eu te condeno; vai-te, e não peques mais.” (8,11).
O segundo relato, que é o sexto sinal, está registrado no capítulo 9. O texto é longo e fascinante. O cego argumenta, os religiosos acusam, os pais do cego se afastam da discussão, enfim, é um texto de ação. Mais: é um texto onde somos interpelados e conduzidos a uma decisão a respeito da nossa fé. Eu o convido a lê-lo ainda hoje.
No prólogo, temos que “a vida era a luz dos homens. Essa luz brilha nas trevas e as trevas não conseguiram apagá-la. (Jo 1, 4 e 5). Na segunda parte do capítulo 8, Jesus havia afirmado: “eu sou a luz do mundo: quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida.” (8,12). O episódio vai mostrar na prática esses dois ensinamentos. A cura de um cego aconteceu em Jerusalém. O episódio pode ser dividido, em atenção à sugestão de Bortolini, em oito cenas. A primeira é descrita nos versículos de 1 a 5. Diante de um cego de nascença, a curiosidade era grande: “Senhor, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?” O ouvinte percebe bem que o interesse não era a pessoa do cego, mas a identificação da causa. Jesus trazia uma boa notícia para aquele homem: “Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo.”
E tem início a segunda cena, versículos 6 e 7. Jesus cospe no chão, faz barro, unta com o barro os olhos do cego e manda que ele se banhe no tanque ou no Lado de Siloé, que significa “enviado”. O rapaz volta enxergando. Foi-se o tempo de escuridão. Agora ele vê a luz. A terceira cena (9-12), mostra os vizinhos e o povo com dúvidas: não é ele o que ficava sentado e pedia esmolas? O rapaz responde: Sou eu.
A seguir, a liderança político-religiosa se aproxima (13-17). O cego curado é conduzido aos fariseus e diante deles apresenta o seu testemunho. Para ele, Jesus era profeta. Quando fala assim, assemelha-se à mulher samaritana em conversa com seu povo. A cena número 5 (18-23) descreve os pais do rapaz sendo interrogados. Os preocupados com a Lei (e não com a pessoa) desejam a confirmação: aquele é o seu filho? Sim, respondem e de agora em diante se negam a oferecer quaisquer detalhes, pois temem a fúria dos religiosos.
A ação retorna ao cego. É a sexta parte (24-34). As autoridades não conseguem amedrontar o rapaz. Ele estava cansado de responder às mesmas perguntas e ousa mudar o tom da conversa: “Nisto pois está a maravilha, que vós não saibais donde ele é, e me abrisse os olhos.” (30b). Para o Antigo Testamento, abrir os olhos dos cegos era tarefa do servo de Javé, personagem que aguardavam (Is 42,7). Os interlocutores não encontram outra saída: expulsam o rapaz.
As duas últimas cenas mostram o momento quando Jesus se encontra novamente com o rapaz. A conversa agora precisaria ser conclusiva. Não há meio caminho, ouvintes. É necessário haver uma decisão. Acompanhemos o relato: “Jesus ouviu que o tinham expulsado, e encontrando-o, disse-lhe: Crês tu no Filho de Deus? Ele respondeu, e disse: Quem é ele, Senhor, para que nele creia? E Jesus lhe disse: Tu já o tens visto, e é aquele que fala contigo Ele disse: Creio, Senhor. E o adorou.” Eu pergunto: qual a sua resposta diante da pessoa de Jesus?
APOIO BIBLIOGRÁFICO
ALLEN, Clifton J.(editor) Comentário Bíblico Broadman vol. 9 .Rio de Janeiro: JUERP. 2ª. edição. 1987. BORTOLINI, José. Como ler o Evangelho de João – O caminho da vida. São Paulo: Paulus. 7ª. edição 2005. BRUCE, F.F. João – Introdução e Comentário. São Paulo: Mundo Cristão. 1987. CHOURAQUI, André. A Bíblia – Iohanân (O Evangelho Segundo João). Rio de Janeiro: Imago. 1997 TAYLOR, W.C. Evangelho de João –Tradução e Comentário. Volumes I, II e III. Rio de Janeiro:Casa Publicadora Batista. 1946.