1 Pe 1, 1-25
Quando nos aproximamos dos escritos atribuídos a Pedro, sempre nos lembramos de louvar e bendizer a Deus pela forma como somente Ele pode transformar a vida de uma pessoa. É desafiador perceber como um pescador de peixes foi de tal modo envolvido com Jesus que passou a exercer influência na vida de tantos, como ainda acontece conosco. Ao lidarmos com as cartas de Pedro, sempre somos convocados a uma vida de esperança, santificação e de firmeza.
Em sua primeira carta, o autor informa que escreve para novos cristãos localizados no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia, os quais considera que tenham sido “eleitos segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos sejam multiplicadas.”
Já de início temos bem explicitada a razão a vida do crente, seja ele um crente novo ou de mais tempo no evangelho: o estilo de vida que precisa ser perseguido é o da santificação. Jesus não morreu para que vidas sejam apenas tocadas. Não. A abrangência da obra de Cristo é maior, pois é por meio de vidas por ele transformadas que outras e muitas outras pessoas podem ser atraídas para Jesus Cristo.
Muitas pessoas têm se perguntado como entender a declaração do autor de que aqueles leitores – e também nós – fomos eleitos segundo a presciência de Deus. Há duas maneiras de compreender o termo presciência e não vamos nos deter aqui, apenas mencioná-las. Presciência, em primeiro lugar, é a capacidade que Deus tem de ver e saber todas as coisas, antes mesmo que elas aconteçam. A outra definição entende presciência como sinônimo de predestinação, que diz que Deus sabe a quem vai salvar e está ativamente empenhado nesse processo.
Fato é que este é um assunto polêmico e que tem dividido a opinião dos crentes ao longo dos séculos. O que não é complicado é o que se segue, a saber, a forma como Pedro conclui a sua saudação: “Graça e paz vos sejam multiplicadas.” Graça, gracioso favor que Deus demonstra a pecadores e que foi evidenciado com a pessoa de Jesus Cristo. Paz, shalom dos hebreus, é mais do que simples tranquilidade ou descanso interior, no sentido psicológico. A paz que Pedro deseja é a condição de alguém estar em harmonia com Deus, não apenas em termos individuais, mas também coletivamente. Sim, para nós também vem a saudação de Pedro: “graça e paz”.
Tão empenhado está o autor em que seus leitores sintam a grande e poderosa presença de Deus em suas vidas, que passa a repetir uma oração na forma e estilo da bênção judaica. Se o povo judeu havia se acostumado a dizer “ Louvado seja o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó”, a Igreja de Jesus Cristo é convocada a dizer: “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos.” O Deus conhecido pela efetuação de prodígios é agora lembrado pelo maior feito da história: a ressurreição de Jesus Cristo. Esse Jesus tornava possível o novo nascimento que significava uma esperança viva e sempre presente na vida do crente.
Lembremo-nos um pouco do que aconteceu com Pedro, discípulo de Jesus. Com a morte de Jesus, Pedro perdeu a esperança. Mas, quando contemplou o Jesus ressurreto, a vida de Pedro foi transformada em uma viva esperança e é nessa condição que Pedro se dirige aos leitores com a certeza de quem sabe bem o que está querendo dizer.
O renascimento que aquele que crê em Jesus pode experimentar faz parte de uma herança que é incorruptível (indestrutível), imaculada (sem mancha) e imarcescível, palavra que indica o frescor perene e duradouro da experiência. O crente renasce para experimentar a vida em uma nova família, para ter a relação de filho de Deus na companhia de muitos irmãos.
Se houve tal renascimento e se uma nova vida existe no crente, ele pode contar em todo tempo e durante todas as dificuldades que enfrenta com o poder e a proteção de Deus. Pedro prossegue: “Portanto, cingindo os lombos do vosso entendimento, sede sóbrios, e esperai inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo; Como filhos obedientes, não vos conformando com as concupiscências que antes havia em vossa ignorância; Mas, como é santo aquele que vos chamou, sede vós também santos em toda a vossa maneira de viver.” (1 Pe 1, 13-15).
Interessante a metáfora aqui utilizada. Cingir é colocar o cinto. Mas aqui a expressão é modificada pela expressão “vosso entendimento”. Entender é mais do que produção de mente. É manter o pleno domínio da mente. É desejar ardentemente e convencidamente fazer algo. Agir assim é deixar de lado todo e qualquer esquema que não se enquadre na santidade de Deus. Isto acontece porque Deus é santo e porque esse Deus, que é santo, nos chamou. Então, se um Deus assim nos chama, ou nos vocaciona, a resposta que se espera é que também sejamos santos em todo o nosso viver.
Esse alvo não é simples, não é fácil de ser atingido e certamente você e eu sabemos disso muito bem. Vamos nos lembrar das circunstâncias que envolviam os leitores: haviam sido criados completamente dissociados do compromisso com Deus, mas, um dia, em determinado momento da caminhada na terra, ouviram a história de Jesus e isso modificou completamente a vida deles. Pertenciam agora, então, à Igreja composta por judeus e gentios, ambos alcançados pela mesma experiência com Jesus. Tanto judeus quanto gentios foram convocados a, em união, espelharem as ações e desejos no modelo que era Deus: ”Porquanto está escrito: Sede santos, porque eu sou santo.”
Precisamos terminar, mas vou fazê-lo a partir de uma história que me foi contada recentemente. Uma senhora de 80 anos de idade ouviu pelo rádio que Jesus Cristo a amava. Quis saber detalhes e, em momento de grande contrição, convidou Jesus a fazer morada na sua vida, a transformar-lhe o coração. Assim que terminou de pedir a Jesus para ficar com ela, começou a chorar. Não conseguia mais parar de chorar e a pessoa que a ajudava ali quis saber a razão, já que Jesus sempre inunda de alegria o coração. A resposta foi bem clara: “eu tenho 80 anos. Desperdicei a minha vida toda.”
É assim o novo nascimento: quando Jesus entra no coração, tudo muda. A santificação é apenas a consequência natural desse processo.