V. 26 - Disse ainda: O reino de Deus é assim como se um homem lançasse a semente à terra, V. 27 - depois dormisse e se levantasse, de noite e de dia, e a semente germinasse e crescesse, não sabendo ele como. V. 28 - A terra por si mesma frutifica, primeiro a erva, depois a espiga, e, por fim, o grão cheio na espiga. V. 29 - E quando o fruto já está maduro, logo se lhe mete a foice, porque é chegada a ceifa. Com a figura do homem lançando a semente; da terra; da sua capacidade de produzir; do ciclo vegetativo e da colheita, Jesus ilustra como as cousas acontecem no reino de Deus. A Palavra começa a produzir efeito quando é lançada no coração que a recebe. E o que semeou observa diariamente o progresso espiritual daquele que a recebeu, mas não sabe explicar como isso acontece. Como a terra tem capacidade de fazer produzir por si mesma, assim também o reino de Deus tem o poder que opera o crescimento espiritual de todo aquele que acolhe a Palavra. É como Jesus explicou a Nicodemos: “O vento sopra para onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito” (João 3:18).
Também como há fases no ciclo vegetativo das plantas caracterizadas pela erva seguida da espiga, depois o grão cheio e finalmente o amadurecimento, assim é o crescimento espiritual dentro do reino de Deus. Tudo acontece naturalmente por etapas, sem que ninguém possa interferir no processo. As pessoas nascem, crescem na graça e no conhecimento de Cristo, para então chegarem à maturidade, isto é, à fase em que a produção do fruto está garantida. É o fruto da obra do cristão de que Jesus fala em João 15:1-17; fruto do Espírito, referido em Gálatas 5:22-23; fruto para a santificação, produzido pela vida cristã mencionado em Romanos 6:22; enfim, este é o estágio que Deus espera para poder realizar a ceifa. V. 30 - Disse mais: A que assemelharemos o reino de Deus? ou com que parábola o apresentaremos? V. 31 - É como um grão de mostarda que, quando semeado, é a menor de todas as sementes sobre a terra; V. 32 - mas, uma vez semeada cresce e se torna maior do que todas as hortaliças, e deita grandes ramos a ponto de as aves do céu poderem aninhar-se à sua sombra. A mostarda é uma hortaliça muito comum na Palestina e a sua semente é conhecida pelo seu pequeno tamanho. Entre as diversas variedades dessa planta existem algumas que podem crescer e tornar-se grandes arbustos com o porte de uma árvore de mais de três metros de altura. Jesus toma um desses exemplares para ilustrar o que acontece no reino de Deus: A pregação da Palavra é como o plantio de uma semente comparativamente pequena, mas potencialmente poderosa, e surpreendente .
Considerando as proporções entre a semente e a árvore já desenvolvida, podemos compreender nesta parábola que o reino de Deus cresce onde a Palavra é semeada, vindo a oferecer grandes benefícios, como uma árvore frondosa que dá sombra e proteção às aves do céu. Em Ezequiel 17:23 encontramos a figura de um reino sólido e acolhedor estabelecido por Deus mesmo, ilustrado em forma de parábola, por uma árvore.
V. 33 - E com muitas parábolas semelhantes lhes expunha a palavra, conforme o permitia a capacidade dos ouvintes. V. 34 - E sem parábolas não lhes falava; tudo, porém, explicava em particular aos seus próprios discípulos. O método de ensino de Jesus por meio de parábolas é enfatizado aqui por Marcos. É importante notar a sua psicologia e a sua didática: Ele levava em conta a capacidade dos ouvintes, e explicava tudo aos seus discípulos em particular.
Os seus ensinos são espirituais e profundos, bem diferentes dos ensinos tradicionais dos rabinos da sua época. Tendo em vista que as multidões e os seus próprios discípulos não tinham condição de receber diretamente conceitos elevados, ele os dosava por meio de parábolas. Com isso ele cumpria as Escrituras, como esclarece Mateus: “Abrirei em parábolas a minha boca; publicarei cousas ocultas desde a criação [do mundo]” (Mateus 13: 35a). V. 35 - Naquele dia, sendo já tarde, disse-lhes Jesus: Passemos para a outra margem. V. 36 - E eles, despedindo a multidão, o levaram assim como estava, no barco; e outros barcos o seguiram. V. 37 - Ora, levantou-se grande temporal de vento, e as ondas se arremessavam contra o barco, de modo que o mesmo já estava a encher-se de água. V. 38 - E Jesus estava na popa, dormindo sobre o travesseiro; e eles o despertam e lhe dizem: Mestre, não te importas que pereçamos! V. 39 - E ele, despertando, repreendeu o vento, e disse ao mar: Acalma-te, emudece! O vento se aquietou e fez-se grande bonança. V. 40 - Então lhes disse: Por que sois assim tímidos? como é que não tendes fé? V. 41 - E eles, possuídos de grande temor, diziam uns aos outros: Quem é este que até o vento e o mar lhe obedecem? Naquele mesmo dia, depois de ensinar as multidões e os seus discípulos em particular dentro do barco, Jesus resolveu atravessar o mar da Galiléia e ir para a outra margem. Era o entardecer e o dia tinha sido de muito trabalho. Ele permanecia dentro do barco com os discípulos que não se haviam preparado para a travessia. Assim mesmo eles o levaram dali de onde estavam, tendo-se apenas desvinculado da multidão, enquanto outros barcos o seguiam. E logo se formou um grande temporal.
A julgar pela descrição do verso 37, deve ter-se produzido um fenômeno muito comum naquela região. Fortes correntes de ar frio descem repentinamente das montanhas geladas que ficam ao norte do mar da Galiléia e batem violentamente contra as águas do lago, produzindo enormes vagalhões e rajadas de vento que põem em risco qualquer barco que esteja navegando por ali.
Em meio a tão grande tormenta estava o Filho de Deus dormindo na perfeição da sua natureza humana, cansado, sentindo o início da rejeição do seu ministério por parte das multidões, e a oposição ferrenha dos seus adversários, que aumentava. Nada disso o perturbava. Ele dormia em paz. Mas os discípulos não o viam assim. Eles viam a morte aproximar-se de todos enquanto Jesus dormia. Alguns deles, pescadores profissionais tarimbados no ofício, viam o perigo de um naufrágio iminente e fatal, o fim de suas esperanças. Eles não acordaram o Mestre para acalmar a tempestade, mas simplesmente porque ele “não se incomodava com o que estava acontecendo”. Foi por isso que o censuraram com palavras como estas: “ O senhor não se importa que todos vamos morrer?” Ele não acordou por causa do barulho das águas ou do vento, e nem por causa do balanço das ondas do mar, todavia acordou por causa do clamor dos seus discípulos. E com uma simples repreensão ao vento e uma ordem ao mar tudo voltou à paz.
A repreensão aos discípulos foi pelo medo que sentiram e pela falta de fé que demonstraram. Eles ainda não tinham olhos espirituais para ver o Mestre como convinha. Caso contrário, não o teriam acordado. Antes, tendo olhos, viam e não percebiam; tendo ouvidos, ouviam e não entendiam. Enfim, o medo que sentiram era por falta de fé naquele que podia dormir no meio da tempestade.
Porém, depois do acontecido, passaram a temer ao Senhor, por causa de tudo o que viram, e da repreensão que receberam. É evidente o assombro que sentiram diante de um personagem ainda tão estranho para eles, pois diziam entre si: “Quem é este que até o vento e o mar lhe obedecem?”. E como se isto fosse uma parábola, a partir daquele dia os discípulos passaram a ter uma compreensão muito mais real daquele a quem seguiam. E, passo a passo, Jesus levou-os à convicção de que ele realmente é o Messias até que, mais tarde o confessaram como tal em Cesaréia de Felipe.
O trabalho de Cristo em seus discípulos, em grande medida, consiste de acalmar a tempestade que neles existe por falta de fé. É como ele promete: “A minha paz vos dou”.
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