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A CARTA DE PAULO AOS GÁLATAS – A VERDEIRA LIBERDADE CRISTÃ (Gálatas 5 e 6)

Diante dos capítulos 5 e 6 da epístola aos gálatas, percebemos a razão pela qual é uma excelente sugestão ler a epístola toda de uma só vez. Ao lê-la em conjunto, com certeza o ápice dos argumentos de Paulo pode ser melhor acompanhado. Porque ele apresentou antes pormenorizadamente as razões da sua indignação, pode fazer o apelo à liberdade, o que foi detalhado nos primeiros doze versículos. Os que haviam sido chamados de insensatos agora têm a chance de avaliar os resultados da escolha que fizeram ou iriam fazer.

“Estai, pois, firmes na liberdade com que Cristo nos libertou e não torneis a colocar-vos debaixo do jugo da servidão.” Gl 5,1.

Paulo desejava que eles permanecessem firmes, que não concordassem em ser enganados com um jugo que traria como resultado a escravidão. Em Atos 5, 10 e 11 Pedro apresentara a solução para o problema que Paulo havia levantado sobre a necessidade dos gentios passarem pelo ritual da circuncisão, quando falou: “agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais puderam suportar, nem nós? Mas cremos que fomos salvos pela graça do Senhor Jesus, como também aqueles (os gentios) o foram.”

Com base nessa decisão, Paulo se volta para os seus leitores agora com questões bem práticas.

Sempre que nos defrontamos com itens de uma lista, a tendência é isolar estes itens do contexto e considerá-los como se fossem, por si sós, suficientes para o entendimento. Não devemos fazer isto agora, porque as instruções de ordem prática estão muito ligadas ao conceito que foi discutido nos capítulos anteriores, quando Paulo tentava fazer os gálatas compreenderem que, ouvindo a voz dos judaizantes que insistiam em acrescentar a circuncisão como fator indispensável à salvação, eles estavam ouvindo não a voz do Espírito, mas sim a voz da carne.

Deus os havia convocado, chamado à conversão, mas o verbo está no tempo verbal que indica que ainda continuava a chamá-los para alturas mais excelentes de visão e de conhecimento. Por que, então, davam ouvidos à voz enganadora? Existia sim uma lei, a lei do amor e viver em amor era infinitamente mais importante do que a exigência da circuncisão.

A esta altura devemos nos perguntar: como posso aplicar este capítulo à minha vida, aos meus dias já que não enfrentamos o mesmo problema que os gálatas? Nenhum de nós foi convocado à circuncisão, como isto se aplica hoje?

Substituamos a palavra circuncisão por qualquer outra que signifique exigência colocada por terceiros como pré-requisito para a salvação e teremos conseguido a atualização deste texto. Nada, absolutamente nada é exigido além da fé em Jesus. Uma vez alcançada a comunhão com Deus por instrumento dessa fé, a conseqüência natural será uma vida em amor, porque direcionada pelo Espírito Santo. A vida em amor é complementar à decisão de fé. Se não houver amor é porque ainda não houve a experiência de fé, quando a pessoa recebe o novo nascimento.

O filho de Deus tem habitando em si o Espírito Santo, que é a fonte da nova vida. Se houver desejo de obedecer às regras que são ditadas pelo Espírito, não haverá ouvidos para qualquer outra voz: “digo, porém; andai em Espírito e não cumprireis concupiscência da carne. Porque a carne cobiça contra o Espírito e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis.” (Gálatas 5, 16 e 17)

Para ser mais claro, Paulo se põe a relacionar o que ele chama de obras da carne. Podemos dividi-las, seguindo a classificação do teólogo Lighfoot em quatro categorias: A primeira lista fala de paixões sensuais que seriam a prostituição, lascívia ou devassidão e também impureza. O segundo grupo merece a nossa especial atenção em função do nosso momento atual. São relacionados os itens que falam do manuseio de coisas espirituais: idolatria, ou seja, reconhecimento público de deuses falsos e feitiçarias, entendidas como mágicas referentes à comunicação com os mortos. A seguir, Paulo lista o que podemos chamar de violações contra o amor fraternal: inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, facções, invejas. O último grupo são os excessos intemperantes: bebedices e glutonarias. (ROSS, Alexander em O Novo Comentário da Bíblia, p. 1245).

Do lado oposto dessa relação está o fruto do Espírito. O mesmo autor elaborou uma classificação também para este.(op.cit.loc.cit) O versículo é o de número 22, que diz: “mas o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança.” O primeiro grupo trata dos hábitos mentais. São eles: amor, que o Espírito Santo inspira na alma o amor a Deus e aos homens. O amor é o cumprimento da lei. Alegria, ou seja, aquele regozijo que bebedeira ou qualquer outro estímulo externo pode dar. Paz ou senso de harmonia no coração no que diz respeito a Deus e aos homens. Amor, Alegria e Paz são os hábitos mentais que compõem o fruto do Espírito.

No segundo grupo estão relacionadas as qualidades sociais: longanimidade, benignidade e bondade. Por longanimidade entendemos a paciência passiva que resiste a injúrias e danos. Mesmo que estejamos sendo prejudicados, o Espírito nos faz caminhar com paciência, com compreensão. A Benignidade é a bondosa disposição para com o próximo. Porque tenho benignidade, pratico a bondade, ou seja, transformo em ação o que o meu coração já determinou. Eu me aproximo do outro com bondade, com o coração disposto a fazer o bem.

O terceiro e último grupo lista os princípios gerais de conduta: fidelidade, mansidão e domínio próprio ou temperança, auto-controle. A idéia é a do indivíduo que sabe controlar firmemente os seus desejos e paixões. Sempre que estudo sobre o domínio próprio eu me recordo de uma missionária norte-americana que trabalhou 40 anos no Brasil. Ela freqüentava semanalmente a casa dos meus pais. Quando chegava a hora da sobremesa, ela fazia uma negociação com ela mesma. Se havia sido cuidadosa na quantidade de calorias da refeição, ela aceitava a sobremesa. Em caso contrário, ela dizia não. Curiosamente a sobremesa era o de que ela mais gostava, então o não simbolizava que, para ela, quem ditava as regras era a cabeça e não o prazer.

Outro exemplo é o de uma senhora crente, ainda muito ativa e por quem eu sinto uma profunda admiração. Ela se recusa a deixar que sua mente fique preguiçosa, esquecida. Faz questão de decorar informações úteis e o faz pelo método da associação, estuda música com afinco e dedicação, pratica ginástica três vezes por semana e mesmo em casa procura se vestir com elegância, porque não permite que seu corpo fique preguiçoso ou se acostume a roupas largas e confortáveis. Ela decidiu que o controle sobre o seu corpo lhe. Porque tem liberdade, dita as regras para o tipo de vida que deseja ter.

Curiosamente, não precisa de remédios porque aprendeu a permitir que seu organismo reaja a qualquer eventual doença. Nos relacionamentos pessoais exercita a prática do perdão, permitindo que as pessoas tenham a chance de uma retratação. Por conseguinte, a companhia dela é agradável e os muitos amigos que tem sempre, mais cedo ou mais tarde, acabam sentindo vontade de conhecer mais a respeito da Bíblia. Porque enxergam a liberdade com que ela vive, desejam saber a causa.

Hábitos mentais, qualidades sociais e princípios gerais de conduta formam o quadro que reflete se é o Espírito Santo que está comandando a vida da pessoa. “Contra essas coisas, não há lei. E os que são de Cristo crucificaram a carne com suas paixões e concupiscências. Se vivemos em Espírito, andemos também em Espírito. Não sejamos cobiçosos de vanglórias, irritando-nos uns aos outros, invejando-nos uns aos outros.” Gl. 5, 22-26.

Diante dessas duas listas, Paulo se sente confortável para terminar a carta, afirmando: “porque o que semeia na sua carne, ceifará a corrupção; mas o que semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna. E não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido” Gl. 6, 8 e 9.

Os gálatas podiam escolher entre a fé em Jesus como suficiente para semear a vida eterna e seguir os ditames da lei judaica. Sempre seria uma questão de escolha, como ainda o é também para nós.

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